Insucesso e abandono escolar no ensino superior em análise
Os percursos escolares dos Estudantes da Universidade de Lisboa são hoje divulgados num Seminário sobre o insucesso escolar no Ensino Superior. Há criticas ao sistema de ensino è aos cursos da Universidade mas a principal causa para o “abandono” do curso parece ser a busca da vocação.
Muitos dos alunos que se candidatam todos os anos ao ensino superior acabam por ficar à porta do sonho e ingressam noutros cursos que não são a sua primeira opção. Alguns ainda frequentam o primeiro ano «para não estarem parados», mas acabam por desistir. Outros nem sequer esperam tanto... Estas “desistências” são a principal causa para os resultados obtidos no “Estudo sobre o Abandono” relativo ao 1º ano do curso, em 2004-05, que é hoje apresentado.
O movimento de transferências e mudanças para conseguir entrar no par instituição/curso que era a sua primeira opção é a principal causa do “abandono” na Universidade de Lisboa, registando-se sobretudo nas Faculdades de Belas-Artes (mudança interna), Ciências, Farmácia, Medicina e Medicina Dentária (transferência para o curso de Medicina).
Além desta motivação - que pode ser um factor positivo - os alunos inquiridos identificam ainda outros motivos de abandono menos lisonjeiros para a Universidade. Variando de faculdade para faculdade, as principais causas do abandono referidas foram, em cerca de 1/3 dos casos, a desmotivação - atribuída ao curso não ser a sua 1ª opção; à desorganização e sobrelotação dos cursos e à consequente falta de atenção às necessidades individuais dos estudantes e à falta de colaboração e de esforço de motivação por parte dos professores -, os problemas financeiros (14%) - devido à inexistência de bolsas de estudo adequadas e à falta de condições de apoio a estudantes-trabalhadores - e, sobretudo, “outras causas” (39%), que englobam razões como estar longe da família; dificuldades de adaptação à cidade; mau ambiente da faculdade; inadaptação ao ambiente académico e más instalações; má organização e professores distantes.
De referir que 64% dos estudantes não teve orientação vocacional na escolha do curso, o que poderá ter contribuído para o subsequente abandono. Cerca de 84% dos estudantes frequentava a 1ª licenciatura quando abandonou os estudos. Quase metade (44%) não concluiu nenhuma cadeira no ano em que abandonou o curso, tendo 21% concluído entre uma e três cadeiras.
Ainda assim, nas Faculdades de Ciências, Farmácia, Medicina e Medicina Dentária, uma grande maioria dos ex-alunos declarou “estar satisfeito com a decisão de ter abandonado o curso” e que “nada os faria continuar” - grande parte deles conseguiu depois, inclusivamente, entrar no curso pretendido
Contudo, nos casos em que o abandono se deveu à inexistência de condições (horários, organização, integração e acompanhamento) que permitissem a prossecução dos estudos por parte dos trabalhadores-estudantes; à falta de adaptação ao novo meio académico, à rigidez do currículo, às aulas sobrelotadas ou à falta de estímulo e de incentivos, os ex-estudantes manifestaram insatisfação com facto de terem abandonado o curso (Faculdade de Letras, Psicologia e de Ciências da Educação, Direito).
Apesar das criticas, o funcionamento da Universidade de Lisboa mereceu também alguns elogios em relação ao estatuto da estudante grávida ou mãe, ao apoio individual prestado, em situações de crise depressiva e a própria iniciativa de lançar um inquérito sobre o abandono.
Possíveis soluções
Na sequência do estudo, e para evitar futuras situações de abandono os autores sugerem uma colaboração com as escolas secundárias do distrito, de onde provem a maior parte dos estudantes, com o objectivo de melhorar as suas condições de orientação vocacional e a sua preparação para o “novo mundo”. Ao mesmo tempo, para uma melhor integração e acompanhamento recomendam a criação de condições pedagógicas e organizacionais de recepção e enquadramento dos novos alunos. Para os responsáveis pelo estudo, este factor «tende a tornar-se particularmente importante» com o “Processo de Bolonha” que permite currículos mais flexíveis «que implicam decisões que só poderão ser tomadas se houver um enquadramento efectivo, sob pena de levarem à desorientação e ao abandono».
A criação de cursos mais práticos e de aulas mais dinâmicas, bem como a institucionalização de outras formas de aprendizagem e de uma maior diversidade de cadeiras de opção e de sistemas de avaliação dos estudantes são outras das medidas sugeridas.
O estudo chama também a tenção para a necessidade de ir ao encontro das características de formação dos estudantes-trabalhadores (ensino nocturno, maior flexibilidade de horários, e-learning...) bem como para a organização de um sistema mais diversificado de bolsas de estudo e de outros apoios na medida em que parte dos estudantes que abandonam a universidade o fazem por falta de apoios financeiros
Sucesso ou Insucesso
Os candidatos aos cursos da Universidade de Lisboa diferem em termos de qualidades académicas alcançadas no secundário. Grande parte destes alunos situa-se no “Bom” e no “Muito Bom”. Estão englobados nestas duas categorias cerca de 82% dos alunos inscritos no 1º ano pela 1ª vez nesta Universidade, e é de assinalar que cerca de 35% ingressa com uma nota entre os 17 e os 20 valores.
Contudo, segundo os autores do estudo “À entrada: um retrato sociográfico dos estudantes inscritos no 1º ano” este «animador panorama académico» destoa do cenário que se esboça a partir dos indicadores do sucesso e do abandono. Por outro lado, comparando as notas de candidatura por Faculdade e por curso constatam-se contrastes entre os alunos de excelência (Medicina, Medicina Dentária, Farmácia, Design em Belas Artes) e suficiência (Letras, Ciências, com cursos como os de Engenharia Geográfica e Informática, Estatística, Energia e Ambiente).
O estudo revela ainda que os alunos com uma nota de candidatura “suficiente” destacam-se nas famílias com um rendimento per capita inferior a 250 euros enquanto que os alunos com “Muito bom” provêm de famílias com um rendimento per capita superior a 750 euros.
Note-se que a distribuição de “melhores” e “piores” notas de candidatura não se reflecte directamente nos valores da “taxa de insucesso”. Segundo o estudo há cursos que captam alunos tendencialmente mais fracos e que apresentam taxas de insucesso baixas (Psicologia e Ciências da Educação, 19.8%); e cursos onde as “muito boas” notas de candidatura registam taxas de insucesso elevadas (Belas Artes – 44.4% –, Farmácia – 41.5% – e Medicina Dentária – 35%).
O insucesso terá porém também na sua origem a procura da identidade vocacional, o desfasamento entre as expectativas e as experiências concretas de ensino-aprendizagem oferecidas ao aluno na universidade ou no curso – o que é mais notório nas situações em que estão colocados em cursos que não eram a sua primeira opção.
Estes são apenas alguns dos dados que serão apresentados durante o Seminário “Insucesso Escolar no Ensino Superior Público: o caso de Lisboa". O objectivo é dinamizar um debate teórico em torno das questões do insucesso, Discutir metodologias para a sua abordagem no terreno e Divulgar informação sobre a sua incidência nestas instituições.
15 de março de 2007
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