1 de junho de 2007

Quando ir à escola magoa

Humilhações e ofensas fazem parte do dia-a-dia das vitimas de bullying. Cerca de metade dos alunos já esteve envolvida neste fenómeno. A maioria não diz nada por vergonha.

João Miguel, aluno da escola EB 2, 3 de Rio Tinto foi vitima de perseguição psicológica e ameaças físicas por parte dos colegas durante ano e meio. O jovem aluno é a mais recente vitima de bullying conhecida.

Apupos, insultos, encontrões, humilhações e ameaças são armas constantes que disparam na direcção de João Miguel e de outros tantos alunos das escolas portuguesas que, por vergonha, preferem manter o silêncio. Segundo Sónia Seixas, doutorada em psicologia, com uma tese sobre o fenómeno do bullying, estima-se que, em média, em Portugal, cerca de metade dos alunos se encontram, de algum modo, envolvidos neste tipo de comportamentos. Tanto podem ser agressores como podem ser vítimas, ou como podem ser vítimas agressivas - os alunos, normalmente menos frequentes, que assumem a dupla dimensão de serem agressores e de serem também eles vitimizados.

«O Bullying é uma conduta agressiva intencional, normalmente entre colegas, com um carácter repetitivo e sistemático que causa sofrimento na vitima e que tem como grande característica, a desigualdade de poder entre os envolvidos», explica Sónia Seixas. E é esta desigualdade de poder entre os alunos – o tamanho e força do aluno, a idade, o estatuto social, o ter ou não ter apoio por parte de outros colegas, ou estar inserido num grupo ou ter um número mais elevado de amigos - que distingue o bullying de outros tipos de violência e que o torna num fenómeno escondido.

No bullying a vitima, submetendo-se a um agressor, aquele que domina, em muitos dos casos não faz qualquer queixa porque, afirma Sónia Seixas, «têm vergonha». E isto levanta outra questão: até que ponto é que as incidências que conhecemos, seja em Portugal, seja noutros países, serão verdadeiras incidências? O fenómeno assume uma dimensão secreta, escondida, minimizada, tolerada ou ignorada por professores, pais e funcionários. «[Os casos] não são fáceis de identificar mas não costumam passar despercebidos entre colegas», alerta Sónia Seixas.

Em termos de perfil os agressores tendem a ser alunos mais auto-confiantes que utilizam a agressão como forma de domínio, reforçando assim a sua sensação de autoconfiança e de auto-estima. São alunos mais activos, com um bom autoconceito físico e socialmente enquadrados sendo vistos pelos pares com uma espécie de ídolo ou de aluno que não se afronta porque se tem medo.

Já as vítimas apresentam um baixo autoconceito, uma baixa auto-estima, uma baixa confiança em si e um maior sentimento de solidão e de isolamento social. Com um número reduzido de amigos e com tendência para serem socialmente rejeitados pelos pares são, de um modo geral, alunos mais tímidos, com uma maior dificuldade de estabelecer relações com os colegas e, consequentemente, também têm menores redes de suporte social que lhes permita ter, eventualmente, colegas que os defendam numa situação de envolvimento com alunos agressores.

Curiosamente, como sublinha Sónia Seixas, verifica-se que o bullying tem consequências no desempenho escolar de ambos os alunos – vitima e agressor - que se reflectem em baixos resultados académicos.

E não se pense que este tipo de agressão entre os alunos faz parte do desenvolvimento normal das crianças. «Os conflitos são normais no desenvolvimento da criança, o que não é natural é resolvê-los de forma agressiva e com violência», salienta Sónia Seixas.

Por isso mesmo, Ministério da Educação, professores, funcionários e pais não podem fechar os olhos face a este fenómeno – que «sempre existiu mas agora tem mais visibilidade» - e têm de cumprir o seu papel.

O primeiro passo poderá ser apostar mais na prevenção de modo a evitar o envolvimentos dos alunos neste tipo de comportamentos. Apostar na formação de professores; sensibilizar a comunidade educativa para o fenómeno do bullying, mostrando que não se trata de algo normal; criar regras de conduta e uma cultura de intolerância zero nas escolas face a estes comportamentos; incentivar a supervisão por parte dos adultos e motivá-los a gerir conflitos, e uma intervenção directa com os alunos, que também passará por ensiná-los a gerir conflitos, são algumas das medidas que Sónia Seixas acredita que podem evitar outros casos de bullying.

Mas para quem já é vitima de bullying a prevenção não chegou a tempo. O que fazer então? «Deve-se dotar a vitima de competências de assertividade para que se autoafirmem de forma afirmativa e não agressiva, não se deixando subjugar ao ataque», explica Sónia Seixas. Mas este passo, como a própria reconhece, «demora tempo».

Entretanto, enquanto estas vitimas silenciosas não desenvolvem melhor a sua auto-imagem e autoestima, há pequenos truques que podem ser seguidos: evitar sítios isolados ou locais onde estejam os agressores habituais – normalmente os episódios ocorrem no recreio ou em zonas como os balneários e os corredores, que se encontram afastadas da supervisão dos adultos -; evitar confrontos com potenciais agressores; utilizar estratégias de humor face à situação, quando são gozados ou troçados; evitar estarem sozinhos e andarem em grupo, procurando integrar-se em brincadeiras, já que sem amigos os alunos são alvos fáceis devido ao isolamento.

Os colegas podem aliás ter um papel essencial na resolução de situações de bullying. Relatando o acontecimento e deixando de ser «os chamados observadores passivos ou a maioria silenciosa», o grupo de pares deve estar sensibilizado para intervir no sentido de acabar com situações de bullying que estejam a ocorrer entre colegas e apoiarem as vitimas deste fenómeno.