15 de fevereiro de 2008

Uma escola diferente

As “Charter School” têm-se espalhado por vários Estados dos EUA. A chave para o sucesso está na autonomia dos professores, na liberdade dos pais e na avaliação externa.

A ideia das Charter Schools surgiu em 1992 e desde então acabou por se espalhar com sucesso pelos Estados Unidos. Actualmente são já perto de 4000 escolas com um total de cerca de 1 milhão de alunos. "Combina o melhor das escolas privadas e o melhor das escolas públicas", defende Charles Glenn, professor de política e administração educacional da Universidade de Boston, e orador na Conferência Autonomia da Escola: A Experiência das Charter Schools na América, organizada pelo Fórum para a Liberdade de Educação, e realizada hoje na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

Com a particularidade de integrar autonomia por parte dos professores, a liberdade de escolha do estabelecimento de ensino que os pais querem para os seus filhos e uma certa fiscalização exterior as Charter Schools são escolas publicas semi-autónomas que funcionam de acordo com um contrato estabelecido com o Estado. Este contrato é uma carta de princípios que define como é que tudo vai funcionar, quais são os objectivos e como será medido o padrão de sucesso.

Livres da burocracia, “que é muitas vezes um empecilho”, salienta Charles Glenn, grupos de professores e de pais, grupos comunitários ou organizações privadas podem assim propor uma Escola cuja abertura será avaliada e decidida pelo Estado. Depois, já em funcionamento, têm de provar constantemente que estão a atingir os objectivos propostos no contrato e que os alunos atingiram as capacidades educativas exigidas.

Financiadas pelo Estado, os valores variam de caso para caso. Cada Escola gere o seu próprio orçamento. Decidem quanto pagam aos professores e aos funcionários mas não podem escolher os seus alunos. Os pais não pagam nada e no caso de o número de candidatos ser maior do que as vagas existentes os alunos são escolhidos aleatoriamente. Anualmente enviam um relatório financeiro e de desempenho e se a Escola não atingir os objectivos o Estado pode reduzir o financiamento ou mesmo encerrar as portas do estabelecimento. Ambas as situações já ocorreram. “São mais livres que as escolas privadas mas têm a responsabilidade de apresentar resultados perante autoridades publicas”, sublinha Charles Glenn.

Para Charles Glenn a popularidade das Charter Schools justifica-se por responderem a dois problemas fundamentais. Por um lado, contribuem para uma maior preocupação com a qualidade educativa e melhoram o estatuto profissional dos professores. Por outro, promovem a justiça e igualdade de oportunidades para crianças de diferentes etnias, e independentemente das suas capacidades financeiras, quebrando assim a relação entre a localização das escolas e o sistema educativo que proporcionam.

A base para que tudo isto funcione em pleno reside em três palavras chave: autonomia, liberdade e responsabilização. “Tem de haver um equilíbrio adequado entre elas”, salienta o especialista. E é esse o grande desafio. Com 7 filhos, defende que a liberdade de escolha é fundamental. “Os pais devem poder escolher uma escola de confiança para os filhos”. Além disso, questiona, se é notório que todos estão interessados num melhor sistema educativo e “se os pais têm direito de voto porque é que não podem decidir qual é a melhor escola para os filhos?”.

Em relação a Portugal, o professor da Universidade de Boston acredita que o modelo das "Charter Schools" poderá ajudar a dinamizar a educação portuguesa, mas ressalva que seria "a última pessoa a sugerir que cada escola em Portugal se tornasse uma Charter School". De acordo com Charles Glenn, Portugal deve "abrir as portas a novos modelos, para que gradualmente se possam instalar, até se mostrarem eficientes".

Entre as vantagens referidas pelos defensores das Charter Schools estão as diferentes opções que estes estabelecimentos oferecem a pais e estudantes; a competição que nasce entre escolas e que leva a que melhorem com o objectivo de manter e atrair mais alunos; a possibilidade de funcionarem como laboratórios de novas experiências educativas e de aprendizagem e uma maior responsabilização, já que correm o risco de fechar se os objectivos não forem cumpridos.

Mas as Charter School não são consensuais. Mesmo nos Estados Unidos há quem veja nestes estabelecimentos vários problemas. Entre as criticas apontadas está o facto de funcionarem como uma instituição de ensino mas ao mesmo tempo como um negócio, estando assim sujeitas às forças de mercado. Por outro lado há também quem defenda que estas escolas são elitistas e contribuem para a segregação.

Roberto Carneiro, antigo ministro da educação rejeita esta critica. Defensor das Charter Schools e do principio da escolha dos pais, não tem dúvidas de que a liberdade é fundamental mas salienta que ainda há muito por cumprir nessa área no que diz respeito à situação portuguesa.

Talvez por isso os intervenientes na conferência não falem de Charter Schools em Portugal. Numa tentativa de aproximação ao caso português David Justino, ex-ministro da Educação, aponta as escolas com Contratos de Associação como “as nossas Charter Schools” mas, sublinha, “sem a responsabilização e a autonomia” das originais.

Para David Justino liberdade, autonomia e responsabilidade das escolas devem ser vistos como "pilares da educação moderna". Por isso mesmo, argumenta, perante um estado que “se assumiu como o principal fornecedor e doutrinador na educação” é preciso perceber até que ponto é que este modelo é compatível com aquilo que se entende como liberdade escolar.

Sem querer comentar as actuais reformas, o ex-ministro defende que será a partir da combinação e equilíbrio entre liberdade, autonomia e responsabilização que poderão sair as soluções para reformas educativas bem sucedidas. "Temos que pensar para daqui a 20, 30 anos, este é que é o grande desafio", conclui.

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